16 de março de 2014

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O Globo: É difícil encontrar alguém que preencha meus requisitos

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- Foi em meados do ano passado, num intervalo das filmagens da comédia “S.O.S Mulheres ao mar” — o filme chega aos cinemas nesta quinta-feira —, que Reynaldo Gianecchini encontrou, por acaso, a amiga Mariana Ximenes. O ator tinha acabado de desembarcar em Veneza, cidade italiana que relutava em conhecer por acreditar que só haveria graça visitar se estivesse namorando.
— Passamos o dia mais lindo das nossas vidas. Foi tão significativo encontrar uma amiga nessa circunstância, do nada. Vivo o presente sem expectativa e deixo a vida me surpreender. Era época da Bienal, e nos emocionamos com a música, com as obras de arte. No dia seguinte, encontrei essa amiga de alma de novo. Dessa vez, ela passou de figuração, lá no fundo, numa cena em que eu estava gravando. Veneza é um labirinto, e eu a encontrei duas vezes sem combinar. Essa sincronicidade, para mim, tem um significado grande. Nada na vida é por acaso — acredita o ator.

A tal sincronicidade também surge nas coincidências entre o ator e seu personagem na novela “Em família”, o bon vivant Cadu, um apaixonado por gastronomia que sonha em abrir um restaurante, mas que descobrirá uma cardiopatia e se submeterá a um transplante. Giane, como é chamado pelos mais próximos, acaba de abrir um restaurante de comida orgânica com a amiga e colega de elenco Giovanna Antonelli e, em 2011, travou uma luta contra uma doença — um câncer linfático —, se submetendo à quimioterapia e a um transplante de medula.
— É inevitável não fazer algum link. A gente empresta todas as nossas experiências ao personagem, de alguma forma o universo é parecido, da fragilidade, de você estar envolvido em uma doença. Então, não tem como não retomar dentro de mim, mas de uma forma muito leve porque minha doença nunca foi uma fase pesada na minha vida, então continua não sendo agora na ficção — frisa ele.
Mas o ator, cujo personagem já começa a apresentar sintomas da doença em cenas, destaca também as diferenças entre as situações vividas na ficção e na vida real.
— Esses dias o Jayme (Monjardim, diretor de núcleo) chegou e disse: “Faz a cena assim, você deve se lembrar da sua doença”. E eu respondi: “Cara, não tem nada a ver com a minha doença”. Não tinha cansaço, não tinha tontura, meus sintomas eram outros, não é exatamente a mesma coisa. Acho que na fragilidade é parecido. O personagem fala: “Poxa, está acontecendo tudo ao mesmo tempo na minha vida”. Eu tive essa sensação também. A vida dá uma virada em todos os sentidos. Você passa a questionar a profissão, se está selecionando os trabalhos certos, as amizades. Com a doença, você indaga tudo. Foi uma grande mudança de entendimento geral de todos os fatores da minha vida — explica.
No campo afetivo, Giane, que diz ainda acreditar no casamento, acha difícil encontrar uma pessoa para preencher os requisitos necessários a ponto de “abdicar da sua liberdade”. Formar uma família definitivamente não é uma obsessão para ele, embora não descarte a ideia de ter um filho.
— Se aparecer essa mulher que me faça entender que ela é uma grande parceira, vai ser incrível. Vários jornalistas perguntam como é para um cara muito assediado não ter ninguém, acham estranho. Essa procura, na realidade, não é de verdade. O público não imagina como é difícil você filtrar pessoas que possam realmente estar ao seu lado, sem deslumbre ou algum tipo de interesse. Tenho uma antena muita boa para isso.
“Em família” marca o reencontro de Gianecchini com o autor Manoel Carlos, responsável pela estreia dele na TV, em “Laços de família” (2000). Discípulo dedicado, ele fala das dificuldades de interpretar uma obra que retrata o cotidiano:
— É quase como se fosse um papo na cozinha. A gente tem uma tendência a querer valorizar o texto, mas quando isso acontece numa novela do Manoel Carlos, você sai do tom. As palavras saem sem querer, do coração, sabe?
Na trama, além da doença, Cadu ficará baqueado ao perceber o interesse da mulher, Clara (Giovanna Antonelli), por Marina (Tainá Müller). Giane elogia a beleza das cenas que mostram a relação das personagens. Ele crê que as sequências românticas refletem a mudança de comportamento do brasileiro em relação às questões ligadas ao preconceito. E dá como exemplo a comoção causada pelo pioneiro beijo entre Niko (Thiago Fragoso) e Félix (Mateus Solano) em “Amor à vida”.
— O público fica dividido se torce pela possibilidade do amor fora dos padrões, não tão fora hoje em dia. Dessa mulher que não é exatamente gay, mas se encanta por uma coisa nova. A ousadia é interessante para quebrar tabus. Por outro lado, a família também é muito bacana. É um casal simples. Eles não têm uma vida tão glamourosa, mas são felizes. E tem muita gente que não dá valor. Só quando você perde dá valor. Você tem uma vida que é muito legal, mas às vezes a fantasia e o deslumbre o tiram dali — reflete.
Já com um volume maior de cenas por conta da virada do personagem, Gianecchini vem se desdobrando para conciliar as gravações da novela com as apresentações da peça “A toca do coelho”, um drama sobre a morte de um filho. Apesar de ainda não ter vivenciado a paternidade, o ator conheceu a dor de uma perda após a morte do pai, em 2011, mesma época da sua doença. Para ele, entender a morte foi enriquecedor.
— Meu pai morreu nos meus braços e foi uma onda transcendental de muita luz, entendi tanta coisa. Não acredito que a morte seja o fim e, sim, o começo de um novo ciclo para uma outra iluminação. Deixou de ser um fantasma para mim. A possibilidade da morte nos faz rever coisas importantes da vida. Quando você sabe que amanhã pode morrer, o hoje tem que ser pleno, cheio de amor, sentido. Aí você pensa: quanta bobagem a gente está fazendo. Para que essa ganância, essa disputa, esse ego inflado? Tem gente que fala: “Ai meu Deus, que desgraça aconteceu na sua vida!”. Enxergo de outra forma.
A tranquilidade do ator também afeta sua relação com o assédio comum à carreira, com o qual — ele diz — aprendeu a lidar:
— Não sou um cara que saí por aí beijando na boca, não fazia isso quando eu era casado, ficava quietinho. Minha intimidade é feita na minha casa. Me incomoda não ter sossego em alguns momentos em que você está com amigos ou uma gatinha. Não quero ficar dividindo minha vida com o Brasil. Então elejo lugares que não têm paparazzo, nem aquela turma que costuma mandar notinha para o jornal. Aprendi a lidar de uma forma saudável, não deixo também isso virar uma neurose. Antigamente pensava: “Poxa, não vou à praia porque está cheio paparazzi”. De uns tempos para cá eu pensei: “Vou deixar de viver porque vou ser fotografado de sunguinha?” Dane-se, vou também.
Giane já apareceu na novela “Em família” na praia, e mostrou que se cuida. Seja por vaidade ou saúde.
— Sempre cuidei da minha alimentação. Mas com o tempo, vamos adquirindo uma consciência maior. Antes, acreditava que comia bem ao pedir uma saladinha com um franguinho grelhado. Hoje em dia, vejo que se a salada estiver cheia de agrotóxico e o frango cheio de hormônio, estou comendo muito mal. Fui atrás dos orgânicos, nutrientes, nada de enlatados. Mas não sou neurótico com nada. Não me privo de comer uma pizza com os amigos, uma carne. E não sou radical com a malhação, embora eu adore fazer exercício para manter o tônus — comenta o ator, tomando um suco de maçã com cenoura em seu restaurante, no Itanhangá, Zona Oeste do Rio.
O novo negócio traz para fora dos sets de gravação a parceria com a amiga Giovanna, sua mulher na novela “Em família”, e que também está no filme “S.O.S Mulheres ao mar”.
— A gente leva nossa intimidade para a cena, o que é muito legal. Temos uma relação de cumplicidade na vida, de estar crescendo juntos a cada trabalho. Agora extrapolou e até sócios viramos. Tive muita sorte com pares românticos. Todas viraram minhas grandes amigas. A Giovanna, eu sempre soube que podia ficar um ano sem ver, sem mandar e-mail, que a amizade seguiria. Ainda tem a Taís Araújo, a Priscila Fantin, a Claudia Raia...
A entrevista foi dada numa mesa mais reservada do restaurante. O ator posou para as fotos que ilustram esta edição bem na hora do almoço, chamando a atenção de alguns clientes, que não o abordam. Mesmo assim, Gianecchini fica meio sem graça.
— Eu morro de vergonha...




Créditos/ Fonte: Esse conteúdo pertence na integra ao site O Globo 




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2 comentários:

  1. Ficamos mais exigentes, cuidadosos conosco e há requisitos difíceis de serem preenchidos como diz Giane. Mas, é lindo ver casais envelhecer comprometidos com verdade no cuidar um do outro.
    Maria

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  2. concihistoriadigital.blogspot.com.br31 de março de 2014 às 19:45

    BELÍSSIMA REPORTAGEM.
    BELO EXEMPLO DE SER HUMANO, HUMANIZADO.
    ISTO É O NOSSO QUERIDO GIANE.
    DEUS O PROTEJA, SEMPRE.

    ABRAÇOS

    CONCEIÇÃO

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